quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Tudo o que é sólido pode derreter

A série é encantadora! Baseada no curta de Rafael Gomes, discorre sobre o cotidiano da personagem adolescente Thereza (Mayara Constantino). Tive o privilégio de assistir dois capítulos. O primeiro teve como temática o poema " Há metafísica bastante em não pensar em nada" de Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O segundo, baseado na obra de "Macunaíma" de Mário de Andrade.
Na mesma semana discutia com uma amiga sobre educação; como transmitir informações e conceitos sem privar a liberdade, assim como a necessidade de selecionar programas juvenis de qualidade.
Que satisfação ver o universo literário transmitido ao adoslescente por este programa! Já está no ar pela TV Cultura faz algum tempo, mas nunca é tarde para elogios e descobertas. Fantástico! Nem tudo está perdido!

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Não orna

Liz joga o cabelo para trás, faz um coque; sobe vagarosamente a rua, não como de costume:

Se eu atravessar o semáforo assim que ele fecha e aumentar a velocidade, pego o próximo aberto. Se sair cinco minutos mais cedo (pelo relógio de fora), pego o ônibus das 22:30.

Na ida sempre cruza com aquele cara na rua. Naquela rua ou em outra rua, até em outro horário, mas sempre no mesmo bairro:

Deve morar por aqui. Tem poucas casas, tem mais prédios, tem uns antigos até que bem grandes. É muito cachorro pra apartamento. Tem gente que não liga. Na volta tomo sopa, já vai ter acabado o mate pelo horário.
E aquela vez que ele beijava um dos cachorros na boca? Foda, beijar cachorro na boca. Daquela vez ele não me viu não. Deve ser um cara sozinho e gostar de heavy metal, tá sempre de preto. Ou sei lá, vai ver o cara é bruxo, já vi alguns por aqui.

Eles sempre se olhavam, um olhar cuja única menção era a espera, um olhar de média duração. Começavam a curta distância. Não era nenhum flerte. Era um olhar pronto pra reagir, mas esperavam a ação do outro pra isso. Cada um seguia seu rumo.
Os olhos dele eram azuis, diferentes do de Liz. Magro, alto, cabelo comprido, ruivo, barba.
“O cara dos cachorros” ela pensava quando o encontrava, saindo de restaurante vegetariano enquanto ela entrava, descendo do metrô enquanto ela subia, na rua com os cachorros:

De novo essa garota, deve morar aqui, já faz uns três meses. Parece que vai estudar esse horário. Não tem cara de que estude alguma coisa séria. Vai ver é mística, este bairro tá infestado disso agora, deve ir fazer algum curso do tipo. Calça amarela estampada com tênis vermelho. Não “orna” como diz minha mãe.
E aquela vez que ela desceu do ônibus bêbada 7:00 da manhã. Foda, mulher bêbada e ainda de manhã. Acho que ela nem me viu. Deve ser uma pessoa sozinha. “A garota da calça amarela”

Luiz sentia o ímpeto de dizer “oi” pra Liz, mas não passava disso. Liz pensava em sorrir e cumprimenta-lo, parava ai.
Até em nome se pareciam e não disseram nada. Apenas a comunicação estereotipada dos estereótipos.